Vejo o mesmo pó do passado
Nos meus móveis novos de cada dia,
E esse mês com cara de limpeza
Vem querendo varrer meus desgostos,
Anunciando uma mudança de gostos,
Um novo tempo, tempo de ventania.
E não há como enterrar o que ainda vive,
O que, estando em mim, também sou eu,
Pois mesmo ensanguentado,
Empoeirado e despedaçado,
Um coração lento ainda é um coração,
E não deve nunca ser jogado no lixo
Nem debaixo da terra largado.
Cremamos então nossos fantasmas vivos,
Pois nem essa terra ingrata os mereceria.
Abramos todas as janelas, deixemos o vento
E novos aromas invadirem o lar,
Ainda que o novo também venha um dia
Feder esse maldito e ingrato enxofre
Que agora nosso inverno finda.
Acendamos os fogos, busquemos calor.
Paremos de conservar velhos corpos no gelo.
O que nos resta é jogar as cinzas pro ar
Ou, novamente, pra debaixo dos tapetes.
Não importa.
Cada um sabe a limpeza mais adequada
Depois que um cadáver deixa a própria casa.
Mas, que não deixemos o fogo de lado, jamais.
Amém.
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